O Mistério de Purim – a Guerra de Gerações

O Mistério de Purim – a Guerra de Gerações

28 de Fevereiro, 2021 4 Por Getúlio Cidade

“O Senhor fará guerra a Amaleque de geração a geração.” (Êxodo 17:16)

A Festa de Purim é um tempo de muita alegria e regozijo porque fala de um livramento milagroso operado por Deus em prol de Israel que é celebrado e passado de geração a geração. Não obstante, a história é envolta por alguns mistérios. Um deles está na ausência do nome de Deus por todo o livro de Ester, o que chega a ser intrigante. Além desse, há ainda outro mistério que envolve a genealogia de dois de seus personagens principais, Mordecai e Hamã.

Mordecai era da tribo de Benjamim e descendente de Quis (Ester 2:5). Quis era pai de Saul, primeiro rei de Israel e também benjamita (1Samuel 9:1). Portanto, Mordecai vinha da linhagem de Saul. Hamã é chamado de agagita em Ester 3:1, uma referência à linhagem de Agague que era ninguém menos que o rei dos amalequitas durante o reinado de Saul (1Samuel 15:8). Assim, Hamã era da linhagem dos amalequitas. E o que isso tem a ver com a história?

Para entender esse mistério, é preciso voltar da Pérsia cerca de oitocentos anos para trás, quando o povo de Israel era peregrino no Sinai e teve a primeira guerra de sua história, exatamente contra os amalequitas, vencido pelo exército de Josué, enquanto Moisés intercedia do alto de um monte em Refidim, auxiliado por Arão e Hur. Ao fim do combate, o Senhor disse a Moisés: “Riscarei totalmente a memória de Amaleque de debaixo do céu” (Êxodo 17:14). E acrescenta Moisés que “o Senhor fará guerra a Amaleque de geração a geração” (Êxodo 17:16). Vemos aqui a personificação de todos os inimigos de Israel em um só povo, o qual o Senhor deseja exterminar da face da Terra devido à maldade extrema contra o povo israelita, tendo sido agredido covardemente no deserto quando estava vulnerável. Não apenas isso, mas vemos também que sempre existirá descendentes de Amaleque em todas as gerações contra as quais Deus se levantará.

Por isso, Moisés declara: “Lembra-te do que te fez Amaleque no caminho, quando saíste do Egito, como te surpreendeu no caminho, e derrubou todos os fracos que iam após ti, na retaguarda, estando tu cansado e afadigado; não temeu a Deus. Quando o Senhor teu Deus tiver te dado repouso de todos os teus inimigos em redor, na terra que o Senhor teu Deus te dará por herança, para que a possuas, então apagarás a memória de Amaleque de debaixo do céu. Não te esqueças” (Deuteronômio 25:17-19). Este trecho é exatamente a porção da Bíblia (parashá) lida pelos judeus nas sinagogas do mundo inteiro no sábado que precede a Festa de Purim, uma menção ao ódio sem motivo dos amalequitas contra Israel. Amaleque representa a epítome do mal por sua crueldade.

Avançando do deserto do Sinai para cerca de trezentos anos adiante, chegamos no tempo do rei Saul. A história se desenrola em 1Samuel 15, quando o Senhor, por intermédio do profeta Samuel, determina que Saul guerreie contra os amalequitas. “Castigarei a Amaleque pelo que fez a Israel. quando se lhe opôs no caminho, quando este subia do Egito (v.2).” E ordena que Saul extermine tudo o que encontrar pela frente, incluindo crianças e animais. Saul, porém, não obedece a ordem integralmente, poupando a vida de Agague e os animais, sendo tal desobediência a causa de sua queda como rei e sua degradação espiritual subsequente, num afastamento crescente de Deus. A relutância de Saul em obedecer nos ensina uma importante lição que é quando deixamos de confessar ou tratar algum pecado em nossas vidas. Isso irá apenas perpetuar o mal que estenderá suas raízes mais profundamente, alcançando nossos descendentes que sofrerão um dano maior em suas gerações, como foi a semente de Agague gerando Hamã que, por pouco, não exterminou o povo de Israel.

Avancemos agora mais cerca de quinhentos anos adiante de volta para a história de Purim, em Susã, capital do império persa. O duelo que se passara há cerca de cinco séculos entre os descendentes de Amaleque e os descendentes de Benjamim volta a se repetir. As duas linhagens se encontram mais uma vez na figura de Hamã, o homem maligno movido por um orgulho e uma sede de poder incontroláveis, assim como por um ódio extremo contra o povo judeu que o torna cego; e na figura de Mordecai, o judeu devoto e íntegro, fiel ao Deus de seus pais, descendente do rei Saul. A disputa se desenrola novamente e, desta vez, restará apenas um vencedor. E este foi Mordecai. Sua fidelidade a Deus permitiu que o Senhor se vingasse dos amalequitas, enviando Hamã e seus dez filhos para a forca que erguera ao tentar assassinar Mordecai. Saul fora rebelde ao deixar Agague e alguns amalequitas com vida. Do contrário, não teria nascido Hamã. Era necessário que se levantasse outro da mesma linhagem, desta vez, alguém que iria ser usado para destruir Hamã apenas por sua postura de integridade e por sua obediência, o que não foi feito por Saul.

Assim o Senhor castigou Amaleque, não definitivamente ainda, pois, como está escrito, Ele fará guerra contra Amaleque de geração a geração, até os tempos do fim. Esse é o mistério de Purim. Sempre haverá um descendente de Amaleque para tentar destruir o povo judeu como tem sido na História. Seus descendentes biológicos e espirituais continuam a se manifestar com seus intentos malignos. No entanto, a palavra final será sempre do Senhor para dar livramento a Israel e se vingar de seus inimigos. Ele é o Deus de Purim, poderoso para livrar. Como escreveu Davi: “O nosso Deus é o Deus da salvação; a Deus, o Senhor, pertence o livramento da morte” (Salmo 68:20).

Os inimigos de ontem e de hoje

Durante Purim, o livro de Ester (Megillat Ester) é lido em voz alta nas sinagogas e nas casas. Quando o nome de Hamã é mencionado, os presentes fazem muito barulho e batem com os pés no chão, num gesto simbólico e divertido de apagar o nome de Hamã, um dos maiores inimigos da história de Israel.

Como Hamã, descendente de Amaleque, o inimigo de Deus se levanta em todas as gerações, ao longo de milênios, para tentar exterminar o povo judeu. Foi assim com faraó no Egito, com Amaleque e com os filisteus nos tempos antigos; foi assim com os inquisidores da Idade Média; e tem sido assim na história contemporânea com Hitler, ou com o grupo terrorista Hamas em suas alianças sombrias com o Irã, ambos pregando abertamente ao mundo que Israel deve ser “varrido do mapa”.

Crédito: Asher Schwartz (JewishPress.com)

Não é mera coincidência que há alguns dias, no início da semana de Purim, o supremo líder iraniano, Ayatollah Ali Khamenei, tenha chamado publicamente o primeiro-ministro de Israel de “palhaço sionista” em suas redes sociais, reafirmando indiretamente o propósito de seu país desenvolver a tão sonhada arma nuclear, em um firme desejo de conseguir “varrer Israel do mapa”. O ex-presidente Mahmoud Ahmadinejad, durante o pleno exercício do cargo, declarou de maneira insana aos quatro cantos do globo que o Holocausto era uma invenção do Estado judeu, negando um evento histórico enquanto ainda há inúmeras testemunhas vivas que sofreram na pele dessa tragédia, bem como fartas provas materiais que comprovam o oposto.

Esses são os Hamãs da era moderna, cegos pelo ódio contra o povo de Mordecai, que pregam a morte dos judeus como um estilo de vida. Não é de surpreender que o Irã seja o Estado moderno da antiga Pérsia, a mesma do rei Xerxes que escolheu uma judia para ser sua rainha. Compreende-se que esse é um inimigo muito além de personalidades políticas ou militares; é o próprio principado da Pérsia que há milênios se opõe a Israel e ao povo judeu; o mesmo principado que pelejou contra o anjo enviado a Daniel da parte do Senhor (ver Daniel 10:13,20); o mesmo espírito de antissemitismo que vemos insuflar o mundo contra Israel hoje. As gerações vêm e vão, mas o espírito de Amaleque operando através delas contra o povo judeu sempre foi o mesmo.

A resposta do primeiro-ministro Benjamim Netanyahu à ameaça iraniana foi dada na última terça-feira, dia 23 de fevereiro, exatamente três dias antes da Festa de Purim: “Digo àqueles que querem nos causar dano — Irã e seus representantes no Oriente Médio — que há 2.500 anos outro tirano persa tentou destruir o povo judeu e, assim como ele fracassou, vocês também fracassarão”.[1]

Longe de ser bravata política, as palavras de Netanyahu têm uma forte conotação profética. Basta olhar para a história de Israel para ver que a fidelidade de Deus veio sempre em socorro do povo que suscitou das entranhas de Abraão, prometendo-lhe preservar sua raiz e cumprir sua promessa, fazendo sua descendência como as estrelas do céu e como os grãos de areia do mar. Portanto, por mais que tente exterminar a semente de Abraão, no final, Amaleque sempre fracassará e o Deus de Israel sempre triunfará, de geração a geração, até “riscar completamente a memória de Amaleque de debaixo do céu”.


[1] Netanyahu: Iran Will Fail like Haman Did 2,500 Years Ago | The Jewish Press – JewishPress.com | Aryeh Savir, Tazpit News Agency | 12 Adar 5781 – February 23, 2021 | JewishPress.com

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