Tabernáculos e a Morada de Deus

Tabernáculos e a Morada de Deus

15 de Outubro, 2022 10 Por Getúlio Cidade

Estamos em meio às celebrações da Festa de Tabernáculos (Sukkot) e gostaria de escrever sobre um tema pertinente a ela, porém, pouco abordado. Todos sabem que, ao longo dos sete dias de celebração, o mandamento é que o povo judeu habite em tendas ou cabanas, conhecidas em hebraico por sukkot, daí o nome da Festa. No entanto, pouco se fala da promessa de Deus em habitar no meio de seu povo. Então, vamos explorar a conexão entre a Festa de Tabernáculos e a morada de Deus entre os homens.

Como todas as Festas do Senhor, Tabernáculos é revestida de simbolismos proféticos. Muitos autores judeus, messiânicos e ortodoxos, escreveram extensamente sobre ela. Porém, por se tratar de uma das Festas do Outono, a se cumprir na segunda vinda do Messias, há muitos mistérios ainda a serem revelados. No volume 2 de A Oliveira Natural, dedicamos um extenso capítulo para Tabernáculos e temos plena consciência de que estamos longe de esgotar o assunto, até porque tal Festa ainda não se cumpriu no cronograma de Deus.

A PRIMEIRA FESTA DE TABERNÁCULOS

A ordem para celebrar Tabernáculos foi dada por Deus a Moisés quando recebeu a Torá no Monte Sinai. Entretanto, só pôde ser cumprida após a conquista da Terra Prometida pelos israelitas. Eles permaneceram habitando em tendas durante toda a peregrinação no deserto e até que cada tribo recebesse sua herança.

Após Moisés ter subido o Sinai pela segunda vez, onde passou novamente quarenta dias na presença do Senhor, o povo se quebrantou e se arrependeu do pecado do bezerro de ouro, e esse período ficou conhecido como Teshuvá. Após descer do monte com novas tábuas da lei, todo o povo compreendeu que havia sido perdoado de seu pecado. Esse foi o primeiro Yom Kippur. Sabiam que não eram dignos e receberam o perdão para toda a nação recém-liberta do Egito.

Deus faz uma aliança com o povo que promete se submeter aos seus mandamentos. “Tudo o que o Senhor falou faremos e obedeceremos” (Êx. 24:7). Logo após essa aliança e da entrega da Torá, o Senhor diz a Moisés para que o povo lhe traga uma oferta “de todo homem cujo coração se mover voluntariamente” (Êx. 25:2). “E me farão um santuário, e habitarei no meio deles” Êxodo 25:8. Esse foi o tempo imediatamente após Yom Kippur, o que equivale à Festa de Tabernáculos. O povo estava alegre por ter sido perdoado do terrível pecado de idolatria. E ficaram mais alegres ainda ao receberem a promessa de que deveriam erguer um tabernáculo para que Deus habitasse entre eles. Não é por acaso que a Festa de Sukkot é conhecida até hoje como zman simchateinu ou “tempo de nossa alegria”.

A partir daí até o final do livro de Êxodo, praticamente todos os capítulos tratam da construção do Tabernáculo e do serviço a ser conduzido nele. O povo já habitava em tendas no deserto. E agora erguem uma enorme tenda para que Deus possa habitar entre eles. O livro de Êxodo termina com a inauguração desse Tabernáculo, com a nuvem de glória que a encobre durante o dia e a coluna de fogo à noite. Essa nuvem que aparecia “perante os olhos de toda a casa de Israel” não somente comprovava que Deus estava com eles, mas servia-lhes de guia “em todas as suas jornadas” até entrarem na Terra Prometida.

A nuvem de glória sobre o Tabernáculo de Moisés durante o dia era substituída por uma coluna de fogo à noite (Ilustração: Pinterest)

Embora tenha sido inaugurado apenas no mês de Nisan, pois sua construção demandou meses, a promessa de habitar em um tabernáculo feito por mãos humanas foi feita durante o tempo de Sukkot. Certamente, a geração mais nova, a que definitivamente entrou na Terra Prometida, guardava consigo a imagem da nuvem que portava a presença de Deus no deserto. Essa mesma geração, já madura ao chegar em Canaã, pôde cumprir o mandamento de Tabernáculos de “habitar em tendas” (Lv. 23:42), porém, distante do Tabernáculo de Moisés que permaneceu em Siló durante 369 anos. Provavelmente, essa geração celebrava a Festa com uma tremenda saudade daquela presença maravilhosa que os encobriu durante 40 anos no deserto.

UMA MORADA PARA O PODEROSO DEUS

Habitar entre seu povo sempre foi um sonho de Deus. Isso remonta ao Éden, quando diariamente vinha ao Jardim para ter comunhão com Adão. Ele se comunicou com os patriarcas, mas foi com o legislador de Israel, Moisés, com quem teve uma proximidade sem precedentes, pois “falava o Senhor a Moisés face a face, como qualquer fala com o seu amigo” Êxodo 33:11. Ainda assim, Ele desejava habitar no meio da congregação, daí a ordem para erguer o Tabernáculo.

Davi compreendeu esse desejo e almejou trazer a arca para Jerusalém. Isso se tornou praticamente uma obsessão durante seu reinado e ele expressou esse sentimento em uma bela poesia: “Não darei sono aos meus olhos, nem repouso às minhas pálpebras enquanto não achar lugar para o Senhor, uma morada para o poderoso Deus de Jacó” Salmos 132:4,5. Não foi fácil realizar esse feito e Davi aprendeu que a arca somente poderia ser trazida mediante as regras de Deus, não as suas.

E assim foi erguido o Tabernáculo de Davi, bem diferente do Tabernáculo de Moisés, pois consistia apenas em uma tenda no Monte Sião para abrigar a arca da aliança. A ausência de véus e de altares tornava esse tabernáculo bem mais simples, o que, por sua vez, transmitia uma maior intimidade entre o povo e Deus que habitava na nuvem que repousava sobre a arca dos querubins.

Sob aquela tenda singela, Davi, muitos levitas, entre músicos e cantores, bem como as demais tribos de Israel passaram horas e dias, durante anos a fio, louvando e adorando ao Senhor ao som interminável dos instrumentos musicais. Era uma áurea indescritível, marcada pela presença majestosa de Deus. Dentre os dois Tabernáculos e os dois Templos da história de Israel, o de Davi parece ter sido o que mais agradou ao Senhor, provavelmente pelo desejo espontâneo do rei e do povo de buscar sua presença íntima. Deus parece expressar um sentimento nostálgico, uma saudade autêntica dessa tenda quando promete restaurá-la em Amós 9:11. A palavra para tenda é exatamente sukkah, o que nos remete à Festa de Tabernáculos e à morada de Deus entre os homens.

TABERNÁCULOS E O TEMPLO DE SALOMÃO

Anos depois, por ocasião da inauguração do Templo de Salomão, ocorreu a mesma manifestação da presença de Deus na inauguração do Tabernáculo de Moisés, quando “saindo os sacerdotes do santuário, uma nuvem encheu a casa do Senhor. E os sacerdotes não podiam permanecer em pé para ministrar, por causa da nuvem, porque a glória do Senhor enchera a casa do Senhor” 1 Reis 8:10,11. Essa nuvem de glória parecia ser mais que um respaldo da presença divina. Era uma maneira do Senhor expressar seu prazer em habitar em meio a seu povo.

Na inauguração do Templo de Salomão, a presença da glória foi tal que os sacerdotes não puderam ministrar (Ilustração: Pinterest)

Em sua oração dedicatória, Salomão ora profeticamente por todos os povos da Terra para que conheçam o Senhor e o temam, assim como Israel (2Crônicas 6:32-33). Essa oração, em conjunto com a profecia de Zacarias 14:16, levou os sábios judeus da antiguidade a enxergarem as nações gentias como protagonistas, ao lado de Israel, na Festa de Tabernáculos, motivo pelo qual também é conhecida como Festa das Nações. De acordo com 1Reis 8:2, a inauguração do Templo de Salomão foi justamente durante a Festa de Tabernáculos, o que confirma que esse é um tempo designado por Deus para fazer sua morada entre os homens.

No entanto, mesmo com essas manifestações sobrenaturais da presença de Deus, Ele intencionava algo mais profundo. Ele mesmo diz: “Onde está a casa que me edificareis? Onde será o lugar do meu descanso? Não fez a minha mão todas estas coisas?” (Is. 66:1-2). “O Altíssimo não habita em templos feitos por mãos de homens” (At 7:48) e o próprio Salomão declarou: “quem seria capaz de lhe edificar uma casa, visto que os céus e até os céus dos céus não o podem conter? 2 Crônicas 2:6. Era necessária uma obra maior e mais excelente do que edificações humanas.

ELE “TABERNACULOU” ENTRE NÓS

O Evangelho de João começa dizendo que o Verbo se fez carne e habitou entre nós (Jo. 1:14). A palavra “habitou” no original grego significa “erguer uma tenda ou um tabernáculo” e equivale, no hebraico, a montar uma sukkah. Logo, uma versão mais fiel ao contexto judaico seria dizer que Yeshua montou sua sukkah entre nós, ou ainda que “tabernaculou” entre nós. Deus não se satisfez em apenas mostrar sua nuvem de glória no passado, mas manifestou a glória de seu próprio Filho para habitar entre nós. Por isso, no mesmo verso, João acrescenta: “Vimos a sua glória, a glória como do unigênito do Pai”.

Deus enviou seu Filho para “tabernacular” entre os homens e mostrar sua glória (Ilustração: Pinterest)

Se considerarmos que a data real do nascimento de Jesus tem grande probabilidade de coincidir com a Festa de Tabernáculos, isso tem uma lógica perfeita.[1] Se, ao longo da história de Israel, Deus sempre marcou sua presença em meio ao seu povo durante essa Festa, que tempo mais apropriado haveria para o Filho de Deus se manifestar na Terra, erguendo sua sukkah entre nós? Não seria essa também a época do ano mais apropriada para o anjo do Senhor aparecer aos pastores nos campos e lhes dizer que trazia “novas de grande alegria” ao comunicar seu nascimento, considerando que Tabernáculos é o “tempo da nossa alegria”?

Após cumprir sua obra redentora e voltar para seu Tabernáculo celestial, Yeshua cumpriu sua promessa de enviar seu Espírito Santo (Ruach HaKodesh) a todo aquele que nele crer e o receber em sua vida. Assim, Paulo afirma que por Ele, “temos acesso ao Pai por um só Espírito (…) Nele vocês também estão sendo juntamente edificados, para se tornarem morada de Deus por seu Espírito” Efésios 2:18,22. A obra perfeita do Messias permitiu tornar seus filhos tabernáculos de carne e osso para morada de Deus.

Por fim, quando reinar absolutamente sobre toda a Terra em Olam Habah, a era vindoura de perfeição na eternidade, Deus estabelecerá definitivamente sua morada entre nós, realizando seu antigo sonho de habitar junto a seu povo sem nenhum impedimento e de modo definitivo e permanente. Foi isso que João contemplou na visão do novo céu e nova Terra: “E ouvi uma grande voz do céu, que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens, pois com eles habitará, e eles serão o seu povo, e o mesmo Deus estará com eles, e será o seu Deus” Apocalipse 21:3.


[1] É de conhecimento praticamente geral e consenso entre estudiosos que a data de 25 de dezembro não é a do nascimento de Jesus. Explicamos isso no capítulo 2 do volume 1 de A Oliveira Natural. No volume 2, apresentamos o cálculo que estima sua real data de nascimento próxima ou dentro da Festa de Tabernáculos.

Leia também:

Yom Kippur e o Ano do Jubileu

A Morte da Rainha e a Shemitá

Explore com profundidade as Festas do Senhor e conheça mais sobre nossas raízes. Leia o livro A Oliveira Natural: As Raízes Judaicas do Cristianismo.