Jonas e o Avivamento de Nínive

Jonas e o Avivamento de Nínive

19 de Agosto, 2021 2 Por Getúlio Cidade

Estamos no mês de Elul, último mês do calendário civil de Israel, normalmente coincidente com agosto/setembro, e, em cerca de três semanas, será celebrado Rosh HaShanah, o ano novo judaico. Elul é um tempo muito especial, pois todos seus trinta dias são dedicados ao arrependimento de pecados e confissão das más obras, buscando-se consertar o caminho e voltar-se completamente para Deus, a fim de se avivar espiritualmente. Arrependimento e avivamento caminham de mãos dadas. Assim, seria oportuno abordar a história do profeta Jonas e o avivamento de Nínive.

Avivamento é uma palavra usual no meio cristão, muito falada, porém, confundida e pouco experimentada. A razão disso é que avivamento pouco tem a ver com espetáculos de músicas de louvor, luzes e danças, grandes aglomerações em estádios e até mesmo conversões em massa. Se tais conversões não forem motivadas por um arrependimento genuíno das más obras, tudo não terá passado de um ajuntamento. Ainda que tais eventos sejam marcados por sinais e curas milagrosas, sem tal arrependimento genuíno, estarão fadados ao esquecimento e tampouco darão frutos duradouros.

Há alguns avivamentos registrados na Bíblia e todos trazem o fator arrependimento em seu bojo. Vejamos o exemplo da descida do Espírito Santo em Pentecostes (leia mais aqui) ou quando o Evangelho foi anunciado em Samaria, ambos no livro de Atos. No entanto, segundo as Escrituras, o único relato de uma cidade inteira a se converter completamente a Deus, desde seu rei ao mais inferior dos homens, foi o de Nínive. E isso só foi possível porque seus habitantes se arrependeram de seus maus caminhos ao serem exortados por Jonas. Assim, pode-se dizer que Nínive foi uma cidade completamente avivada no sentido mais original da palavra.

O PROFETA REBELDE

Jonas é um dos personagens mais conhecidos da Bíblia, até pelos que nunca a leram, pois sua história se tornou amplamente difundida e contada ao longo dos séculos e milênios. Embora muitos acreditem que se trate de uma alegoria, o fato de Jonas ter passado três dias e três noites no ventre de um “grande peixe” foi citado por Yeshua como tendo ocorrido literalmente (Mt. 12:40).    

O grande peixe mencionado no livro pode muito bem ter sido uma baleia ou um cachalote. Há registros históricos em jornais norte-americanos, no final do século XIX, de um marinheiro chamado James Bartley que foi engolido por um cachalote, tendo permanecido em seu estômago por 36 horas e sobrevivido. Após sua morte, dezoito anos mais tarde, em sua lápide foi colocado seu nome com a inscrição: “Um Jonas dos dias modernos”.[1] Há cerca de dois meses, um pescador de lagostas na costa de Massachussetts, Estados Unidos, foi completamente engolido por uma baleia jubarte, tendo permanecido cerca de quarenta segundos no interior do animal que o cuspiu em seguida.[2]

Dentre todos os profetas, Jonas se destaca por um lado negativo. Ele relata no livro de sua autoria que, ao receber a ordem de Deus de ir para Nínive, toma a direção contrária e vai para Társis “a fim de fugir da presença do Senhor” (Jonas 1:3). Não é comum ver esse tipo de comportamento nos profetas de Israel. Todos eles têm suas fraquezas e falhas, porém, nenhum se mostra tão rebelde como Jonas. Deus o manda para um lugar e ele toma um rumo oposto.

De certa forma, podemos até entender a reação de Jonas, pois Nínive, a imensa capital do reino da Assíria, era uma cidade iníqua, repleta de maldade e idolatria. Entretanto, o propósito de Deus é alcançar todas as pessoas em todos os lugares, sem preferências ou discriminação, pois Ele é um Pai bondoso e deseja que toda sua criação trilhe o caminho da vida que se encontra em seu Nome. A rebeldia de Jonas lhe custou caro. Ele aprendeu de forma dolorosa que não se busca descanso fugindo de Deus.

Por falar em descanso, o sono pesado de Jonas durante a tempestade que açoitava o barco não era de tranquilidade, mas do peso da culpa. Tanto foi assim que, logo que despertado pelos marinheiros em desespero, ele o reconheceu, alegando que toda aquela tormenta era devido a seu ato de fugir da presença do Senhor. Por esse motivo, o mar ficava cada vez mais bravio à medida que o tempo passava. A solução era, segundo o próprio Jonas, que a tripulação o lançasse pela borda para que o mar se acalmasse. E assim foi.

Que enorme diferença para com Yeshua! Ele também enfrentou uma dura tempestade no Mar da Galileia enquanto dormia um sono profundo (Mt. 8:23-27). Este, sim, era o justo sono de descanso por seu trabalho incansável na obra do Pai. Tal qual os marinheiros fizeram com Jonas, os discípulos fizeram com Yeshua, despertando-o com medo de naufragarem. Yeshua, no entanto, não foi tomado pelo pânico. Ele repreendeu o vento e o mar, havendo uma grande bonança em seguida.

A rebeldia de Jonas, ao fugir da presença de Deus, apenas aumentava a força do vento e das ondas a cada momento, enquanto que a obediência de Yeshua lhe conferia autoridade para dominá-los. Quando seguimos no caminho da obediência, as tempestades que surgem para nos afligir e provar têm um tempo designado por Deus para cessarem. Quando, porém, seguimos no caminho da rebeldia, as tempestades nunca cessarão; apenas aumentarão de intensidade. Será impossível alcançar o porto de destino.

A MISERICÓRDIA DE DEUS EM AÇÃO

Jonas é lançado para fora do barco pelos homens e a fúria do mar cessa imediatamente, o que leva o temor do Senhor àqueles marinheiros que oferecem sacrifícios a Deus e lhe fazem votos. Assim, Ele usou a situação de rebeldia de Jonas para alcançar toda a tripulação daquele barco e lhe mostrar misericórdia. Quanto a seu filho rebelde, Ele também não permitiu que morresse afogado. “Preparou, pois, o Senhor um grande peixe, para que tragasse a Jonas; e esteve Jonas três dias e três noites nas entranhas do peixe” Jonas 1:17. Embora de forma esdrúxula, Deus também mostrou sua misericórdia a Jonas.

E é das entranhas desse grande peixe, nas profundezas do mar, que Jonas encontra a presença divina, clama ao Senhor, converte-se de sua rebeldia e se consagra inteiramente a Ele. Essa bela oração está no capítulo 2 de seu livro e é também uma profecia a respeito da ressurreição de Yeshua. Muitas vezes, é necessário que sejamos lançados nas profundezas do caos para termos um encontro com Deus. Porém, se de fato percebemos sua presença e nos rendemos a Ele, esse caos terá valido a pena.

Ao se dirigir novamente para Nínive, agora sem hesitar em obedecer, Jonas foi o primeiro a mostrar arrependimento, corrigindo literalmente seu rumo, indo em direção à vontade de Deus e não em caminho contrário. Só assim seria possível pregar a palavra de arrependimento à iníqua Nínive. O profeta possuía agora autoridade para exortar o povo da cidade, pois vivia o que pregava.

Jonas em hebraico é יונה (Yonah), o mesmo nome para pomba. A primeira vez que uma pomba aparece nas Escrituras é em Gênesis 8, quando Noé solta a ave para verificar se as águas do dilúvio haviam baixado. “A pomba, porém, não achou repouso para a planta do seu pé, e voltou a ele para a arca; porque as águas estavam sobre a face de toda a terra; e ele estendeu a sua mão, e tomou-a, e recolheu-a consigo na arca” Gênesis 8:9.

Essa é uma passagem profética e parece condensar a história da vida do profeta rebelde muitos séculos depois. Assim como a pomba (yonah) se afastou de Noé e não encontrou descanso por causa das muitas águas, Jonas (Yonah) também se afastou do Senhor e não encontrou descanso devido às águas tempestuosas do mar. Assim como a pomba (yonah) voltou para Noé e para a segurança da arca, Jonas (Yonah) também se voltou para o Senhor e para a segurança de sua presença, nesse caso, o ventre do peixe.

Assim como a arca foi usada para salvar a pomba (yonah), o “grande peixe” representou a graça e a misericórdia de Deus para salvar Jonas (Yonah). O verbo “voltou” para a pomba possui a mesma raiz do substantivo para arrependimento ou do verbo arrepender-se. Logo, a volta da pomba simbolizava profeticamente o arrependimento de Jonas por ter pecado contra o Senhor, voltando-se para Ele.

O profeta outrora rebelde agora prega para que toda a cidade de Nínive se arrependa. Para sua surpresa, é exatamente isso que ocorre. Ao ouvirem sua exortação, os ninivitas creem em Deus, jejuam e se vestem de pano de saco, um sinal explícito de humilhação e quebrantamento. A mensagem alcança o rei da cidade que proclama um jejum para todos os habitantes, incluindo os animais, e que “todos clamem a Deus com todas as suas forças” (Jonas 3:8). Quem sabe Deus não se arrependa e não nos destrua? — declara o rei de Nínive (Jonas 3:9). É isso que acontece e toda a imensa capital do império assírio é salva do juízo iminente.

 O arrependimento primeiro ocorre no coração de um homem que, em seguida, exorta uma cidade inteira a fazer o mesmo, voltando-se para Deus, antes que pereçam em suas más obras. Toda uma cidade se arrepende e confessa seus pecados perante o Senhor. Por fim, o próprio Senhor “se arrepende” de destruir a cidade; todos são salvos pela graça e misericórdia de Deus. Esse é o ciclo completo do arrependimento e que sempre ocorre na salvação de uma pessoa, de um grupo, de uma cidade ou de uma nação. Arrependimento, confissão, mudança de mente e atitude. Foi assim com Jonas, com a tripulação do barco em que viajava e com toda a cidade de Nínive. Isso é a real essência de um avivamento. É a pura misericórdia de Deus em ação.


[1] https://en.wikipedia.org/wiki/James_Bartley

[2] https://noticias.r7.com/hora-7/homem-e-totalmente-engolido-por-baleia-jubarte-durante-mergulho-14062021#/foto/6; e

https://www.capecodtimes.com/story/news/2021/06/11/humpback-whale-catches-michael-packard-lobster-driver-mouth-proviencetown-cape-cod/7653838002/

Leia também:

Lições de Quarenta Anos no Deserto

O Dia Trágico de Tisha B’Av

Sua assinatura não pôde ser validada.
Você fez sua assinatura com sucesso.

A OLIVEIRA NATURAL

Newsletter

Assine nossa newsletter e mantenha-se atualizado de notícias e temas sobre as raízes judaicas do cristianismo.