O Tribunal de Nuremberg e a Festa de Purim

O Tribunal de Nuremberg e a Festa de Purim

3 de Março, 2023 3 Por Getúlio Cidade

Aproxima-se a celebração de mais uma Festa de Purim que, juntamente com Tabernáculos, é uma das mais alegres do calendário judaico. O livro de Ester (Megillat Ester) é um dos mais envoltos em mistérios nas Escrituras. Neste artigo, quero abordar um exemplo desse misterioso livro profético na história contemporânea que trata de mais um dos capítulos da longa guerra de gerações travada entre Israel e Amaleque: o Tribunal de Nuremberg e a Festa de Purim.

Ao final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, iniciaram-se os julgamentos no Tribunal de Nuremberg contra os réus nazistas acusados de crimes de guerra, o que se estendeu por quase um ano. Dos acusados, doze foram condenados à morte por enforcamento, sendo que um deles não fora capturado e foi julgado à revelia. Dos demais, um deles, Herman Goering, cometeu suicídio na prisão antes da pena de morte. Logo, restaram dez que foram enforcados no mesmo dia. Um deles, Julius Streicher, ao ser conduzido para o cadafalso, entre suas últimas palavras, gritou para os presentes: Purimfest 1946! (Festa de Purim 1946!).

Obviamente o nazista conhecia bem a história bíblica do livro de Ester. De modo incrível, estabeleceu uma ligação inusitada: a da condenação à forca dos dez nazistas com os dez filhos de Hamã enforcados na Pérsia há cerca de 2.300 anos. Assim como Hamã, os nazistas tentaram exterminar o povo judeu da face da Terra. Não somente fracassaram, mas, nas duas ocasiões, seus intentos malignos foram revertidos em favor dos judeus.

Não é novidade que o nazismo tinha seu lado oculto, para não dizer satânico, que conduzia os atos de Hitler e seus fanáticos seguidores a todo tipo de maldade impensável contra seus supostos inimigos, dos quais o povo judeu era o principal. Eles conheciam a fundo as festas do calendário judaico para profaná-las e cometer seus crimes com crueldade. Em um de seus pronunciamentos de rádio, Hitler declarou, em 30 de janeiro de 1944, que, se os nazistas fossem derrotados, os judeus poderiam celebrar a destruição da Europa em uma triunfante segunda Festa de Purim.[1] Hitler era um tipo moderno de Hamã e assim era visto pelos judeus da época.  

O CÓDIGO DE ESTER

A pena de morte por enforcamento dos dez nazistas condenados vai além da correspondência com o enforcamento dos dez filhos de Hamã e envolve um mistério mais profundo do qual Streicher certamente desconhecia, escondido nas letras do rolo de Ester em uma espécie de código. O trecho que enumera os dez filhos de Hamã que foram mortos contém uma formatação diferente no original. Os nomes aparecem do lado direito de cada linha. Ao lado esquerdo, está a conjunção vav (ו)+ a preposição et (את) que pode ser traduzido simplesmente pela conjunção “e” em português. Logo mais abaixo, segue uma foto tirada de uma cópia que tenho da Tanach para mostrar essa formatação (o hebraico se lê da direita para a esquerda). Não é preciso saber hebraico para observá-la.

Um comentário antigo da Tanach sobre essa estranha formatação explica que ela é assim para mostrar a forma vertical com que os filhos de Hamã foram enforcados, em uma forca alta, um sobre o outro. Além dessa disposição especial, há letras de tamanho diferenciado nos nomes, mais difíceis de observar, as quais destaquei em vermelho na foto. São três letras pequenas — tav, shin e zayin (ת,ש,ז) — e uma grande — vav (ו).

Os sábios judeus há muito tempo afirmam que qualquer variação das letras no texto superficial das Escrituras possui um significado especial. Em muitos casos, essas variações permanecem um mistério. Mas nesse caso específico do livro de Ester, o mistério foi revelado. Como as letras no hebraico possuem valor numérico, a soma das letras pequenas totaliza 707 e elas apontariam para o ano judaico de 5707 que corresponde a 1946 no calendário gregoriano, ano em que foram enforcados os dez nazistas condenados em Nuremberg.

Por representar o número 6, alguns autores viram na letra vav grande, constante no último nome, a indicação do sexto milênio e por isso o ano seria 707 do sexto milênio ou 5707 da criação do homem. Durante cerca de 2.300 anos, os judeus leram o rolo de Ester sem saber o significado dessas letras de tamanho diferente do texto normal, até que o mistério foi revelado quando o evento ocorreu em 1946, na execução dos réus de Nuremberg.

Trecho do livro de Ester no original (cap. 9:7-9) com os nomes dos filhos de Hamã à direita, dispostos verticalmente. As letras de tamanho diferente estão destacadas em vermelho. As menores, tav, shin e zayin indicam 707. A letra vav em tamanho maior indica o sexto milênio. O ano codificado é 5707 do calendário hebraico, equivalente a 1946 (Foto do autor)

Uma observação minha e que não poderia deixar de fazer é em relação à coluna da esquerda que tem, antes de cada nome a conjunção “e” (vav) mais a preposição et. Esta preposição é formada pelas letras alef (א) e tav (ת), as primeira e última letras do alfabeto hebraico que nos remete diretamente às palavras de Yeshua em Apocalipse 22:13, em que Ele diz ser o Alef e o Tav (alfa e ômega no grego), o princípio e o fim. É como se Deus estivesse falando para cada um dos filhos de Hamã, inimigos de Israel, que Ele é o Senhor do universo que cria todas as coisas e que detém a última palavra sobre todos os acontecimentos.

Nessa relação do tribunal de Nuremberg com a história de Purim, o código de Ester ainda é cercado de outros detalhes surpreendentes. A pena de morte por enforcamento não era comum em um tribunal militar com a participação dos Estados Unidos. O indicado era que o condenado morresse fuzilado ou em uma cadeira elétrica. No entanto, a condenação dos nazistas à forca parece ter sido evocada das palavras da rainha Ester: “enforquem os dez filhos de Hamã” (Ester 9:13).

A sentença de morte dos nazistas foi dada em 1º de outubro de 1946 e caiu entre Rosh HaShanah e Yom Kippur, período conhecido como Dias de Temor, tempo de juízo divino e acerto de contas. A pena de morte foi executada no dia 16 de outubro de 1946, em Hoshana Rabbah, quando, segundo a tradição, é o dia em que o julgamento do mundo é finalizado. Além disso, o Talmude acrescenta em um comentário sobre o rolo de Ester que uma filha de Hamã se suicidou e não precisou ser enforcada. Em 1946, esse fato se replicou em um dos “filhos” de Hitler, Herman Goering, que também se suicidou na prisão horas antes do enforcamento.

Outro detalhe curioso está em Ester 9:11, quando o rei Assuero (Achashverosh) diz à rainha que os judeus mataram quinhentos homens de seus inimigos na capital Susã e os dez filhos de Hamã. Em seguida, pergunta a Ester qual seu desejo e ela pede que os dez filhos de Hamã sejam enforcados “amanhã”. Mas os filhos de Hamã já estavam mortos. Qual o sentido de enforcá-los? Aqui vale ressaltar um comentário dos sábios sobre essa passagem que diz: “Há um amanhã que é agora e um amanhã que é no futuro”.[2] Em outras palavras, Ester estava pedindo que o episódio dos filhos de Hamã não ficasse isolado na História, mas pediu profeticamente que seu enforcamento se repetisse no futuro. Assim, também de modo profético, ela estaria se dirigindo a Deus, o único capaz de atender esse tipo de pedido. E Ele o atendeu por meio do enforcamento dos nazistas em Nuremberg, os outros dez filhos de Hamã.

Os réus nazistas (filhos de Hamã) no Tribunal de Nuremberg. Na fileira da frente, da esquerda para a direita, estão: Hermann Goering, Rudolf Hess, Joachim Von Ribbentrop, Wilhelm Keitel e Ernst Kaltenbrunner. Na fileira de trás estão: Karl Doenitz, Erich Raeder, Baldur von Schirach, e Fritz Sauckel.

PEQUENOS MILAGRES

A repetição da trama de Purim no Tribunal de Nuremberg é apenas um dos muitos mistérios contidos nesse pergaminho fascinante da Tanach. Quantos outros estão escondidos até que sejam revelados? O maior deles, como sabemos, é a ausência do nome de Deus. Embora não mencionado uma única vez, sua presença está por toda a parte. Vemos isso também nas “coincidências” de Nuremberg. Ele age oculta e poderosamente, movendo as engrenagens, trabalhando nos detalhes aparentemente sem importância. Ele parece esconder sua face, mas não está alheio ao que ocorre na terra dos viventes. Aliás, o nome Ester vem da raiz “esconder” e se refere ao verso da Torá em que Deus diz: “Esconderei totalmente meu rosto naquele dia (…) (Dt. 31:18).[3]

Assim, uma maneira de compreender esse misterioso livro é enxergar cada acontecimento como um pequeno milagre. Por exemplo, a escolha de Hadasah (nome hebraico de Ester) como rainha para que estivesse nessa posição para “um tempo como esse”; a noite de insônia do rei que o fez lembrar do ato de Mordecai para livrá-lo da morte; a chegada de Hamã ao palácio para pedir a forca para Mordecai no momento em que o rei buscava honrá-lo; enfim, tudo bem orquestrado e sincronizado como em uma sinfonia regida por um maestro perfeito. Não há como não lembrar aqui da célebre frase de Albert Einstein: “Há duas formas para viver sua vida: uma é acreditar que não existe milagre, a outra é acreditar que todas as coisas são um milagre”.[4] É com esse enfoque que Megillat Ester tem de ser lido.

Após os julgamentos do Tribunal de Nuremberg que reproduziram a história de Purim, em 1946, com seus pequenos milagres, um enorme milagre aconteceu. Foi a improvável e, até alguns anos antes tida como impossível, criação do Estado novo de Israel em 1948, após quase dois mil anos de diáspora e apenas um ano e meio da tentativa de Hitler (o Hamã da era contemporânea) de extirpar o povo judeu da Terra, matando mais de seis milhões deles, cerca de dois terços de sua população na Europa. Nenhum nazista, nem mesmo Streicher em seu lúcido grito de Purimfest 1946 poderia imaginar algo assim. Esse foi um dos momentos da História em que Deus decidiu mostrar para o mundo quem está definitivamente no comando. Não importa o esforço do inimigo para impedir seus planos. É Ele quem tem a palavra final sobre o destino dos homens e das nações.

O julgamento de Nuremberg foi apenas o desfecho de mais um capítulo da longa guerra de gerações entre Israel e Amaleque, conforme prometido por Deus em Êxodo 17:16 (leia o artigo para melhor compreensão). A descendência de Amaleque, ancestral de Hamã e eterno inimigo de Israel, não foi totalmente destruída e persiste em fazer guerra contra a descendência de Abraão em todas as eras. Assim será até sua definitiva aniquilação, quando Deus “riscar completamente a memória de Amaleque de debaixo do céu” (Êxodo 17:14). Então, os mistérios de Purim nos serão todos revelados.


[1] Philip Goodman, The Purim Anthology (Philadelphia 1949), p. 4, apud Bloch e Ron em Purimfest 1946.

[2] Moshe Katz, Computorah, p. 99-100.

[3] Guemará, Chulin 139b.

[4] Só há duas maneiras de viver a vida: a… Albert Einstein – Pensador


Referências

Moshe Katz, Computorah, Kest-Lebovits Jewish Heritage and Roots Library, 1996.

Emmanuel Bloch e Zvi Ron, Purimfest 1946: The Nuremberg Trials and The Ten Sons of Haman, The Torah.com


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