Os 144 mil e sua Missão

Os 144 mil e sua Missão

24 de Fevereiro, 2023 1 Por Getúlio Cidade

O livro de Apocalipse abre um leque de vários tópicos a respeito dos últimos dias e da vinda do Messias. Dentro da escatologia messiânica, esses tópicos estão bem encadeados na sequência das Festas do Senhor que ocorrem no outono, assunto abordado no volume 2 de A Oliveira Natural. Assim, há várias passagens interligadas aos acontecimentos do fim, usando-se uma sublinguagem própria das Festas, não apenas em Apocalipse, mas por toda a Bíblia, especialmente nos profetas. Por esse motivo, Apocalipse precisa ser interpretado não isoladamente, mas em conjunto com todas as Escrituras. Logicamente, isso inclui o tópico dos 144 mil e sua missão. Vamos buscar entender um pouco mais sobre ele.

“Depois disso, vi quatro anjos em pé nos quatro cantos da terra, segurando os quatro ventos da terra, para que nenhum vento soprasse sobre a terra, nem sobre o mar, nem sobre árvore alguma. Vi outro anjo que subia do nascente do sol, tendo o selo do Deus vivo. Ele gritou com voz bem forte aos quatro anjos, aqueles que tinham recebido poder para causar dano à terra e ao mar, dizendo: — Não danifiquem nem a terra, nem o mar, nem as árvores, até marcarmos com um selo a testa dos servos do nosso Deus. Então ouvi o número dos que foram marcados com selo. Eram cento e quarenta e quatro mil, de todas as tribos dos filhos de Israel.” Apocalipse 7:1-4

Os quatro ventos apontam para o juízo iminente sobre a Terra. Essa interpretação provém das próprias Escrituras, quando Deus promete trazer sobre Elão “os quatro ventos”, pondo em fuga seus moradores por todas as nações (Jr. 49:36). Isso se encaixa no contexto de juízo sobre as nações descrito em Apocalipse, a ocorrer no tempo conhecido como Dia do Senhor e, especificamente para Israel, durante as Dores de Parto do Messias. Estes dois temas requerem o conhecimento das raízes judaicas para melhor compreensão e já foram abordados em artigos anteriores. 

O SELO DE PROTEÇÃO

Imagem: Anglican Connection

O selo é um símbolo usado por todas as Escrituras para indicar propriedade e autoridade real. Ao profetizar a respeito da destruição pendente sobre Jerusalém, Ezequiel ouve o Senhor instruir um anjo para marcar com um selo na testa todos os que não se profanaram com a idolatria reinante na cidade. Em seguida, ao determinar a exterminação de seus moradores, Ele ordena: “não se aproximem de ninguém que tiver o sinal na testa” (Ez. 9:4-6). Logo, o selo na testa indica que os 144 mil são propriedade divina e que devem ser preservados em meio aos terríveis juízos que se seguirão.

Quando Davi fugia de Saul, escondeu-se na caverna de Adulão. Durante seu tempo de fuga e provação, experimentou a proteção divina sobre si e escreveu diversos salmos para expressar sua angústia e, ao mesmo tempo, gratidão a Deus por essa proteção. A palavra Adulão, Adulam (עדלם), tem o valor numérico de 144 e por isso é o número bíblico para abrigo e refúgio. Não é por acaso que justamente o salmo 144 seja um desses em que Davi exalta a Deus como seu refúgio e clama por proteção e livramento. “Ele é o meu Deus misericordioso e a minha fortaleza, o meu alto retiro e o meu libertador, o meu escudo, em quem me refugio” (Salmo 144:2). Também não é por acaso que a medida do muro da Nova Jerusalém seja 144 côvados (Ap. 21:17), sendo muro um símbolo de proteção e abrigo.

Não é de surpreender o fato de que a marca da besta seja colocada também na testa dos homens, além da mão direita, em um claro sinal de afronta a Deus, pois Satanás, sendo o seu inimigo, busca não somente lhe fazer oposição, mas imitá-lo. Ele falsifica o que é de Deus. A marca da besta, seja ela qual for, é uma maneira de reivindicar as almas para si, levando-as à condenação, exatamente o contrário do selo de Deus. Logo, os 144 mil marcados na testa receberão uma proteção sobrenatural durante o período de maior aflição e angústia para o mundo. Eles o atravessarão, mas serão preservados pelo Altíssimo quando os quatro ventos do juízo forem liberados sobre a Terra.

OS 144 MIL SÃO JUDEUS

Quem são os 144 mil? Qual sua missão? A resposta é clara no texto de Apocalipse e não cabe aqui interpretações quanto ao que está tão direto: todos são judeus! Doze mil de cada uma das doze tribos de Israel (Ap. 7:4-8). A tribo de Efraim aparece substituída por seu pai José que se soma à tribo de seu primogênito Manassés. Apenas a tribo de Dã está excluída. Por quê? O motivo não é claro, porém, a resposta pode estar novamente nos demais livros das Escrituras.

Após entrar na Terra Prometida, Dã foi a primeira tribo a cometer idolatria, quando o Tabernáculo estava em Siló, erguendo uma imagem de escultura (Juízes 18:30). Dã também foi o local onde foi erguido um dos dois bezerros de ouro, o que se tornou em uma pedra de tropeço e um pecado terrível, gerando grande divisão entre o povo (1Re 12:29-30). Isso pode ter sido o motivo de sua exclusão dos 144 mil de Israel.

Sem sombra de dúvida, os 144 mil são uma classe especial, não são melhores do que o remanescente de Israel, mas são especiais, diferenciados. De fato, quando são mencionados mais adiante, diz-se que são “os que não se contaminaram com mulheres, pois são virgens” (Ap. 14:4). Assim, vê-se que todos são homens, purificados de todo tipo de imoralidade e impureza sexual, que possuem um caminhar e proceder santos, pois “na sua boca não se achou engano, são irrepreensíveis” (Ap. 14:5).

Provavelmente, são todos jovens, bem jovens, e acredito que muitos deles serão adolescentes. Sabemos que nas comunidades judaicas religiosas, especialmente dentro de Israel, os jovens se casam bem cedo e virgens, e não se expõem à imoralidade sexual. Esse contexto é plausível e realista dentro da descrição de João, mesmo nos dias de tanta luxúria, impureza e incontinência sexual do mundo contemporâneo.

Imagem: Flickr

TESTEMUNHAS DO CORDEIRO

A missão dos 144 mil está entre as mais árduas, porém, entre as mais nobres. Após o arrebatamento da Igreja (natzal), eles passam a testemunhar de Yeshua para Israel e para as nações durante a última semana de Daniel, também conhecida como Grande Tribulação.[1] Há uma antiga interpretação messiânica sobre os 144 mil que parece muito interessante sobre sua missão. Embora sendo cumpridores da Torá e judeus devotos, eles não reconhecem que seu Messias seja Yeshua. Isso mudará instantaneamente quando virem a noiva sendo arrebatada em algum momento durante a Grande Tribulação, provavelmente entre o início e fim da primeira metade da última semana de Daniel.

Há várias interpretações comparativas com as Escrituras a esse respeito. Uma das mais curiosas é em relação a história do arrebatamento de Elias. Ao vê-lo ser tomado aos céus, Eliseu recebeu uma porção dobrada de sua unção para executar seu ministério de modo eficaz em dias muito difíceis para Israel, como ocorrera com Elias. Assim se dará com os 144 mil que são zelosos da Torá, porém sem a revelação do Messias. Ao vê-lo tomar sua noiva nos ares, eles se converterão a Yeshua, recebendo uma unção dobrada em poder, o que os capacitará a testemunharem eficaz e ousadamente de Yeshua para o remanescente de Israel e para as nações, antes de sua volta ostensiva, quando “todo olho o verá”. Nessa interpretação, Elias representa a Igreja e Eliseu os 144 mil.

Nessa linha interpretativa, Paulo também seria um tipo dos 144 mil. Embora perseguisse a Igreja de Deus, teve uma visão de Yeshua após a ressurreição, o que levou à sua conversão imediata, e o tornou o mais eficaz de todos os demais apóstolos em seu testemunho do Evangelho. Como ele mesmo disse, seu nascimento se deu fora de tempo (1Co. 15:8), o que ocorrerá também com os 144 mil. Entretanto, tudo isso está dentro do perfeito controle de Deus, segundo seus santos propósitos. Paulo, como rabino fariseu e perfeito conhecedor da aliança de Deus com Abraão, afirmou que o Evangelho teria de ser pregado primeiro ao judeu, depois aos gentios (Rm 1:16), e assim ele fez. Isso se repetirá com os 144 mil que testemunharão primeiro a seus irmãos judeus a respeito de Yeshua e, em seguida, às nações.

Isaías parece profetizar sobre os 144 mil a respeito de seu testemunho às nações ao dizer em nome do Senhor: “Porei entre elas um sinal e alguns dos que foram salvos enviarei às nações, a Társis, Pul e Lude, que atiram com o arco, a Tubal e Javã, até as terras do mar mais remotas, que jamais ouviram falar de mim, nem viram a minha glória; eles anunciarão entre as nações a minha glória” Isaías 66:19. Este é um capítulo que contém diversas profecias ainda não cumpridas, tal qual as Dores de Parto do Messias, a restauração futura de Jerusalém e de Israel, bem como os novos céus e a nova Terra, tópicos também abordados em Apocalipse. Além de mencionar o sinal na testa dos 144 mil, a profecia diz que eles serão enviados às nações, em todas as direções. Após testemunhar para seu povo, eles irão às nações para servirem de testemunhas do Cordeiro em um tempo de terríveis juízos.

Os 144 mil aparecem no livro de Apocalipse entre a abertura do sexto e do sétimo selos. A abertura do sétimo selo traz consigo as sete trombetas. No capítulo 7, imediatamente após a menção dos 144 mil, João vê “uma grande multidão que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas, que estavam em pé diante do trono e perante o Cordeiro” (v.9). Então, aqui ocorre o arrebatamento, enquanto os 144 mil são selados para serem preservados durante o restante da Grande Tribulação. Eles só reaparecem no capítulo 14, desta vez, no céu, perante o Cordeiro, adorando diante do Trono com um cântico novo que ninguém podia aprender, a não ser os 144 mil (v.1-3). Há uma clara distinção aqui entre o arrebatamento da Igreja e o arrebatamento dos 144 mil, o que pressupõe que serão levados mais tarde durante a Grande Tribulação e antes do retorno do Messias aos olhos de toda a Terra.

Imagem: Pinterest

PRIMÍCIAS PARA DEUS

Como os 144 mil seriam os primeiros a se converter após o arrebatamento da Igreja e durante a Grande Tribulação, são chamados de “primícias para Deus e para o Cordeiro” (Ap. 14:4). O termo primícias é bikkurim em hebraico, o mesmo usado para a Festa das Primícias, quando é dedicada a oferta movida pelo sacerdote no Templo. É também o mesmo termo usado para a oferta das primícias em Pentecostes.[2]

A dispensação dos gentios, ou plenitude dos gentios, como chama Paulo, ou o que se conhece também como tempo da graça se iniciou justamente na Festa de Pentecostes, a partir dos doze discípulos de Yeshua, todos judeus. A partir, de então, o Evangelho se espalhou de Jerusalém para toda a Terra (e continua sendo pregado ainda hoje). Essa dispensação se encerrará com os 144 mil, também todos judeus e discípulos de Yeshua, como foram os doze iniciais. Vale notar que 144 mil é múltiplo de 12, número bíblico para governo. Eles pregarão novamente o Evangelho a seus irmãos judeus e, posteriormente, às nações, provavelmente após a dispersão que se dará após a quebra da aliança do anticristo com Israel, no meio da semana de Daniel, quando a perseguição aos judeus será tenebrosa.

Dos judeus, de acordo com os profetas, os que sobreviverem à Grande Tribulação serão conhecidos como o remanescente de Israel que se encontrará com o Messias quando Ele retornar para Jerusalém, quando “todo Israel será salvo” (Rm. 11:26). Assim, a grande colheita que foi iniciada com doze judeus será encerrada com outros 144 mil judeus. E se cumprirá a palavra do Senhor: os primeiros serão os últimos, e os últimos os primeiros.

Os 144 mil, sendo os últimos, serão os primeiros e seguirão o Cordeiro por onde quer que Ele vá (Ap. 14:4). Deus em sua sabedoria os escolheu para serem suas testemunhas na hora mais escura de toda a História e os constituiu primícias para si. E, em sua graça infinita, permitirá que, mesmo nesse período de trevas e juízo, quem ouvir a mensagem dos 144 mil e se arrepender, alcance a salvação.


[1] O tema arrebatamento da noiva é bem explorado no volume 2 de A Oliveira Natural, bem como a Grande Tribulação e as Dores de Parto do Messias, ou o Tempo de Angústia de Jacó.

[2] As Festas das Primícias (Bikkurim) e Pentecostes são exploradas no capítulo 7, volume 1, de A Oliveira Natural.


Leia também:

A Grande Tribulação e as Dores de Parto

Como o Ladrão de Noite

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